A propósito de...
DIA INTERNACIONAL DA MULHER OU DIA DA IGUALDADE DE GÉNERO ? (Abel Ribeiro, 8 de Março de 2015)
Gosto mais da segunda formulação (Igualdade de Género).
Considero as celebrações dominantes e mais comuns, uma passagem, anual, de um "atestado de menoridade", ás mulheres (ou melhor, os seres humanos do sexo feminino, pois "mulher", para nós, confunde-se com um estatuto marital) , emitido por elas próprias :as festas e festejos onde, num só dia, "one night only", têm o direito, dado pelo "marido" ou "pai" ou outra "autoridade" máscula, de fazerem aquilo que muito condenam nos homens (ser-se excessivo em comportamentos como no consumo de alcool, nas horas de "entrada" em casa, ir a locais com "cenas proibidas", tipo bar com "strippers", etc). Isto, sim, é aceitar um estatuto de menoridade, que não contem, em si, antes o nega, nenhuma afirmação ou procura da igualdade de acesso e usufruto de direitos, que é a raiz original do tão degradado "Dia da Mulher"...
Onde está a evocação das questões da igualdade de género ? Não nestes eventos...
Nos muitos locais onde passo, por razões pofissionais, também vejo divulgadas formas de comemoração nas quais me revejo : a evocação e afirmação da visão feminina do Mundo e da Vida, nas Artes, na Cultura em Geral, na vida política, etc .
Perdoem-me o academismo que se segue, mas penso que o que separa e distingue esses tipos de comemorações é a confusão entre 2 conceitos : "sexo" e "género".
MARCEL MAUSS, antropologo (1872/1950) dizia, cito, “DIFERENÇA é a qualidade que permite que algo se distinga de outra coisa. O termo, que deriva do latim 'differentĭa', pode ser usado para mencionar a variedade assumida de coisas de uma mesma espécie.”
Dizia ainda, “A DIVERSIDADE, que deriva do latim 'diversitas', entre os seres humanos deriva de fatores naturais e sociais; entre os naturais, destacam-se os físicos/biológicos; os sociais não passam disso mesmo em termos étnicos, de sexo, aos quais se acrescentam os socio-históricos, os culturais, os do conhecimento”. Terminava a sua reflexão afirmando “ A DIFERENCIAÇÃO é a diversidade e diferença sem uma hierarquia de valores a ela associada.”
O psiquatra africano e pai da independência das colónias francesas, FRANTZ FANON, dizia o fundamental : “ A DISCRIMINAÇÃO consiste na ideia de que certas características, possuídas por certas pessoas são razões suficientes para que os interesses dessas pessoas não sejam considerados do mesmo modo, i.e., que não tenham os mesmos direitos” .
A questão está aí : sermos diferentes é problemático quando e se, sobre a diferença, se fizerem juízos de valor; então, esta torna-se fator de DISCRIMINAÇÃO.
Eu valorizo que exista uma maneira europeia de ver o mundo, uma americana de o fazer, um cristã , uma islâmica, etc, de o fazer , desde que tal não discrimine.
Por isso reconheço e gosto que exista uma maneira de ver o mundo no feminino, de ver a vida no feminino, de pensar no feminino.
De facto, "Sexo é uma realidade biológica/orgânica" e "Género" corresponde ás representações e papéis sociais atribuídos a pessoas de cada sexo. Por isso, para mim, faz mais sentido, no século XXI, falarmos em igualdade de género, ou seja, lutar para que os papéis e representações sociais atribuídos a pessoas de cada sexo, deixem de ser discriminatórios e fator de discriminação. Mas isto sem amputar a maneira própria que cada pessoa, por ser homem ou mulher, tem de ver o mundo e a vida, precisamente por ser desse sexo.
A diferença e a diversidade são enriquecedoras e factor de progresso pessoal e social; a discriminação feita por causa da diferença ou diversidade, provoca a desigualdade e é factor de exclusão.
Encerrando o academismo, deixo a reflexão do politólogo italiano Igino Giordani, nos anos 50 :
“Somos Homem ou Mulher em tudo o que fazemos, com uma forma de pensar, sentir e agir que o sexo marca, pela sua carga biológica. Por exemplo, o prazer que sentimos com o nosso sucesso em algo que fazemos, tem uma evidente carga sexual (em toda a dimensão do termo), que Homem e Mulher sentem de forma diferente, pois o seu corpo assim o é. Isso significa, só, diferença, nunca deve ter intensidade valorativa. É essa diferença que torna autêntico e completo esse prazer. Somos seres com genitalidade, mesmo se, fisícamente no senso comum, não somos sexualmente ativos.”
Igino Giordani, “La rivolta morale” (1958)
